quinta-feira, 22 de junho de 2017

Relação do que tem acontecido do outro lado do Uruguai dado pelo Tenente Domingos dos Esquadrões de Entre-Rios


Autor: Tenente Domingos José das Neves
Unidade: Esquadrões de Milícias a Cavalo do Distrito de Entre Rios
Área: Província de Corrientes (Províncias Unidas do Rio de la Plata)
Datas Extremas: 19.1.1817 - Março 1817

[19.1.1817] Passou-se no passo abaixo da Cruz, primeiramente a partida do tenente Luiz de Carvalho, este foi atacado pelo capitão Vicente [Tiraparé, desertor] com a sua partida, e com pouco fogo fez afastar e pôs o passo franco para a passagem da coluna, a qual passou no mesmo dia, e no seguinte [20.1.1817] avançou ao Povo, estando-se retirando na noite antecedente o Artiguinhas [Andrés Guaçurarý y Artigas, comandante das Missões Ocidentais] com 300 homens achou-se tão somente no Povo dois padres velhos e 3 ou 4 famílias brancas; no outro dia [21.1.1817] fez marchar 300 e tantos homens comandados pelo Capitão [José Maria da] Gama [Lobo]  de Granadeiros do Regimento [de Infantaria] da Ilha de Santa Catarina em seguimento do dito Artiguinhas, o qual já não encontrou 6 léguas abaixo de Yapeyú [Japeju, no original], e não encontrando voltaram ao Povo de Yapeyú e depois de o saquearem o arrasaram [a]tacando fogo em tudo o que era coisa em circunferência do mesmo Povo, e retirando[-se] a reunir-se à coluna foram queimados e destruídos todos os arranchamentos que encontraram até onde alcançavam as partidas que exploravam o Campo, matando alguns garruchos que encontravam dispersos pelo Campo; [26.1.1817] depois de incorporadas com a coluna mandou o Brigadeiro [Francisco Chagas dos Santos] arrasar o Povo da Cruz com fogo tendo feito seguir o saque dos ditos dois povos, parte pelo rio, e parte pelas carretas que tinham levado, para o povo de S. Borja, e ele Brigadeiro marchou com a sua coluna pela costa do Uruguai em direitura ao Povo de S. Tomé botando de si partidas bastantemente longe para destruírem todo o edifício que encontrassem o que assim fizeram matando também algum garrucho que disperso topavam. 

No dia [31.1.1817] que chegou a S. Tomé se lhe apresentou o capitão comandante do povo D. Julião de tal com meia dúzia de moradores, e este capitão lhe entregou [as] chaves da igreja, e lhe deu notícia de dois caixões de prata que Artiguinhas tinha por ele Julião mandado depositar longe em uma capela [capilha, no original] que havia, e este sendo desde o princípio desta revolução apaixonado pelos portugueses meteu os dois caixões que só ele e dois indios sabiam e se foi em um capão de mato buscar e passar para o Povo de S. Borja aonde se acha em depósito com o saque que veio dos dois povos que só em prata destes 3 povos se avalia de 50 arrobas para cima, 20 e tantos finos, havendo 5 entre estes como o grande de Porto Al.e [Alegre], e daí seguindo-se para baixo gradualmente até o ponto de Campanas, depois de entrado o Brigadeiro no Povo de S. Tomé acampou a coluna dentro do dito Povo, e daí mandou ao tenente Luís Carvalho com uma partida sobre outra de garruchos que lhe deram parte e iam retirando com carreta e animais vacuums e cavalares, os quais o dito tenente encontrou; e depois de os destroçar escapando tal e qual com vida tomou uma carreta e 400 e tais animais mansos cavalares, e 150 e tantas reses mansas, isto e varas de leite e bois mansos, recolhendo-se com isto ao povo [1.2.1817 ?]: daí a 4 dias tornou a ir o dito Carvalho com 120 praças a bater uma partida que se estava juntando na costa do Paraná logo que seguiu a poucos dias encontrou uma partida de 30 garruchos mais ou menos a qual destroçou escapando desta 3 ou 4 com vida; daí seguiu a tomar uma porção de cavalhada que se achava em um rincão, a qual achou juntamente com 300 ou 400 reses mansas; depois seguiu a procurar a partida dos 300 garruchos a qual veio a  encontrar o dito Carvalho; este os bateu que logo imediatamente se puseram em fuga e seguindo parte destes se foram refugiar nas Guardas de Corrientes a quem o dito Carvalho pediu que lhos entregassem, e logo assim o fizeram e daí os mandou passar pelas armas ficando as ditas guardas muito amigas do dito Carvalho.

Juntando-se o saque que andou por 2000 e tantos cavalos mandos e mulas mansas, três carretas, duas carregadas de erva de mate, duzentas e tantas vacas mansas, e 150 bois mansos que tudo conduziu ao quartel de S. Tomé, cujo povo foi saqueado e tudo quanto se podia conduzir até de madeiras, e grande número de milheiros de tela se queimou e arrasou e se veio acampar o Brigadeiro com a coluna sobre a margem ocidental do Uruguai em frente ao passo de S. Borja. 

A tantos passou o comandante do Povo de S. Nicolau com 30 ou 40 homens ao lado ocidental do Uruguai e arrasando a guarda que aí se achava, a tomaram matando tão somente ou 2 ou 3 da dita guarda, e os mais se puseram em fuga os quais os nossos não seguiram por terem feito o avanço a pé, e depois que passaram os cavalos e montaram forão avançar ao Povo da Conceição sem acharem resistência alguma. Depois com ordem do Brigadeiro Chagas saquearam o Povo e [o] arrasaram; e os outros três povos: S. Maria, Marta e S. Carlos foram saqueados e arrasados a fogo, e tudo que era em circunferência de 6 léguas mais ou menos todo e qualquer edificio que se encontrava se fazia o mesmo.

Os paraguaios [paraguays, no original] logo que souberam que estava a campanha livre de inimigos, passaram duas companhias deles que se achavam sobre a margem ocidental do Paraná e se vieram meter dentro do povo de Candelaria, e logo fizeram um ofício ao Brigadeiro Chagas dando-lhe os parabéns pela sua boa felicidade, a qual muito estimavam. Tendo passado o Brigadeiro a este lado oriental do Uruguai ao povo de S. Borja, se demorou aí seis dias, e neste tempo tinha subido Artiguinhas que se achava no Passo do Rosário com 400 homens, e subindo para riba com a notícia do Carvalho que andava pela costa do Paraná e da destruição dos povos, fez suas proclamas [seus proclamas, no original] fazendo ver aos seus que era necessário juntar-se para punir-se e castigar-se os rebeldes portugueses, e seguindo juntamente pela costa da Miriñay [desmboca no Uruguai, com a foz do Quaraí a leste] logo que chegou na primeira guarda pertencente a Corrientes aí fez passar a uns poucos pelas armas, que o mesmo ia fazer a todas as guardas de cima por terem entregado a sua gente ao Luís Carvalho. 

Estas logo que souberam da vinda de Artiguinhas expediram um chasque ao Brigadeiro Chagas pedindo-lhe socorro; este consultando com os seus oficiais assentou em lhe mandar pedir 2000 cavalos para os poder ir socorrer por se achar a pé, cuja resolução não sei o seu resumo, por ter sido isto tratado na véspera da minha saída para este lugar; é o que na realidade sei.


N. B. No encontro da passagem de Luís Carvalho com o Capitão Vicente de Naturais este saiu baleado escapando de morrer por negar fogo a pistola do Tenente Luís Faiada (?) dos nossos Guaranis que este o seguiu pelo meio da rusma (?) dos garruchos a fim só de matar o dito Vicente, porém tendo a infelicidade da pistola lhe negar fogo por causa de um papel que tinha no fogão, dando volta ao seu cavalo meio rodou em um cupí e como estava muito longe da nossa gente e muito no centro da garruchada gritou logo o Vicente que o matassem com as lanças o que puseram em obra, porém o dito Faiada se pôs logo imediatamente a pé com a sua espada na mão e se defendeu das lanças até que chegou socorro da nossa gente, não deixando de ficar ferido de uma lançada na coxa a qual chegou a criar bicho(s) sem este dito tenente Faiada nunca querer dar-se por doente, e foi continuando sempre em todas as diligências que fez o tenente Luís Carvalho; nesta ação tomou-se um morteiro o qual traziam montado em um armão fincado em um cepo, o qual no primeiro tiro que fizeram saltou do dito armão pela boa segurança em que vinha pois era um armão feito por eles.

Fonte

- ARQUIVO HISTÓRICO DE ITAMARATY, Ministério das Relações Exteriores: AHI-REE-00944: “Rio da Prata: Documentos sem importância – 16 folhas, 1811-1818”.

quarta-feira, 21 de junho de 2017

Extratos do Diário do Brigadeiro Oliveira (Março de 1817)


Autor: Brigadeiro graduado Joaquim de Oliveira Alvares
Unidade: Legião de Voluntários Reais de São Paulo
Área: Fronteira do Quaraím
Datas Extremas: 1.3.1817 - 26.3.1817
Fonte: Arquivo Histórico do Itamaraty, AHI-REE-00944: “Rio da Prata: Documentos sem importância – 16 folhas, 1811-1818”

Março 1 [1817]
Apresentou-se Bento Manuel [Ribeiro], que fora explorar a campanha com 20 homens, e referiu que chegando a Arapeí fizera avançar dois bombeiros, um português, outro espanhol, aprisionado na Batalha de Catalán, que tendo passado Mata Ojo, onde não descobriram vestígios do Inimigo, se adiantaram muito além deste arroio, donde, nada sendo observado, voltaram com o desígnio de reunir-se ao capitão. 
Acharam-se improvisadamente atacados em Mata Ojo por uma partida, de que se escaparam por estratagema. Mas como se suposeram já livres do perigo, o espanhol ficou um pouco atras a beber água, continuando o português a sua marcha; o qual ouvindo depois 2 ou 3 tiros, persuade-se que o espanhol fora apanhado e morto. 
Em consequência desta noticia o capitão Bento Manuel apressou-se a chegar ao Exército de medo de ser atacado por forças superiores. 
O Brigadeiro, apesar da atenção que lhe tem merecido a bravura deste oficial, não pode deixar de supor com a parte mais sensata do Exército, que Bento Manuel, tendo caído no desacerto de servir-se como Bombeiro de um espanhol insurgente, havia poucos dias prisioneiro (a quem tiveram a indiscrição de soltar com mais de 150 outros) e que tendo este podido escapar-se, o capitão se recolhera com medo de ser descoberto, e atacado. 
O brigadeiro já concebeu ideias menos favoráveis deste oficial por ocasião da ultima diligência, de que foi encarregado a qual se malogrou no conceito do brigadeiro, por que o capitão Bento Manuel ou se ocupou, ou deixou ao seus ocupar-se, intempestivamente em roubar cavalos.

Março 5  [1817]
Chegou ao Exercito, remetido por Bento Correia, partidário, empregado sobre as vizinhanças de Bagé, e atualmente ocupado em correr gados nos territórios espanhóis, um correntino o qual depôs que se chamava Manuel Gomes, e é soldado miliciano da Companhia de Quintana, anexa à Partida de [Fernando] Otorgués: que fora aprisionado em um sítio ou fazenda de Batovi Chico, onde tinha ido comer melancias, sem licença: que Otorgués se acha acampado nos fundos do Campo de Margarita Conde; sobre a costa do Rio Negro, com 400 homens, compreendidos Milicianos, vecindários, duas companhias de Dragões e uma de negros (composta de setenta e tantas praças), em geral moradores da Costa do Rio Negro até Cerro Largo, bem armados de espingardas, clavinas e espadas: que Otorgués não tem esperanças de outro reforço, por não haver mais moradores a quem possa convocar: que este chefe não tem armamentos de reserva: que tem uma peça de 4, e que pelo que respeita a munições, tem não só as suficientes distribuídas pelas tropas (32 cartuchos por praça), mas ainda uma carretilha bem provida tanto de munições da peça, como de armas pequenas: que ele supunha que Otorgués não só se não reunia a Frutuoso Rivera, por se haverem desavindo em Santa Luzia Chica, mas mesmo com [José] Artigas, pois que tendo-lhe ordenado que se lhe reunisse com toda a sua gente recusara obedecer-lhe, e lhe mandara unicamente 200 homens de cavalaria bem armados de clavina e espada; e não permitia que família alguma da Costa do Rio Negro se lhe fosse ajuntar: que em consequência os moradores suspeitavam que Otorgués intentava apresentar-se ao Exército Português: que dos correios de Artigas não se coligia a Tropa que atualmente tem; mas que do último de que lhe consta, se sabia que das vizinhanças do Paraná e Santa Fé se lhe tinham agregado perto de 1ooo Guaicurus, que esperava muito mais, que estava reunindo gente, a quem procurava muito disciplinar: que Frutuoso Rivera está em Santa Luzia-Grande com mais de 1000 homens, incluídos 200 que lhe cedera Otorgués, e finalmente, que algumas partidas, deste partidário patrulham sobre Cerro Largo e Olimar.

Março 6  [1817] 
O senhor General em Chefe [Joaquim Xavier] Curado recebeu uma parte do Comandante de Bagé Pedro Fagundes de que se lhe tinham apresentado 2 desertores da partida de Otorgués os quais dizem que sobre o Cerro Largo andava uma partida de 200 homens que mandara este insurgente, e que sobre o Olimar patrulhavam alguns exploradores. Saiu o capitão Bento Manuel (Milícias do Rio Pardo) com 6 homens os quais devem continuar unidos até certa altura, e depois separarem-se. Bento Manuel seguirá com 3 até o Arroio da China, e de lá procurará orientar-se para obter notícias do exército do Senhor [Carlos Frederico] Lecor. Os outros 3 dos quais é guia o soldado miliciano Domingos do Couto seguirá em direitura a Montevidéu. O Brigadeiro não espera grandes resultados desta diligência. 

N. B. Para inteligência de V. S.ª direi que Domingos do Couto, é irmão de Manuel do Couto, que V. S.ª deve conhecer, por ser conhecido da família.

[Oliveira]

Março 10 [1817]
Chegaram ao senhor Curado ofícios do comandante de Bagé, Pedro Fagundes. Desejoso de saber notícias do Serro Largo, mandou o castelhano Pedro Pablo Portilho com 2 Portugueses, que não encontraram obstáculo; e voltaram com uma certidão do Cura e jurada sub fide Sacerdotis, pela qual consta não haver insurgentes naquelas vizinhanças. Afirmam que no Cerro Largo só se acham 6 ou 7 famílias além do Rev. Cura, que dizem não é pequena, apesar de ser escolhida. No dia 5 de Março, apresentou-se-lhe, a Pedro Fagundes, um sobrinho e companheiro de Manuel Vieira, que obtiveram licença para correr, e que efetivamente corriam, gados nos Campos do Pereira (situados sobre a margem meridional do Rio Negro, onde desemboca o arroio Chileno) o qual, tendo sido perseguido por uma Partida de 20 insurgentes, pouco mais ou menos, e não podendo fazer resistência, conseguira escapar-se sem poder ter obtido notícias de seu tio e dos outros companheiros. Em consequência, Pedro Fagundes mandou a um Miguel Valente com o sobrinho do Vieira para bombear a partida inimiga: ainda não tinham voltado a 10.

Março 12 [1817]
O tenente coronel António Pinto [de Fontoura] deu notícias na revista do sol posto, que nas vizinhanças de Itaquatía foram aprisionados um F. Bueno e 3 escravos, e mortos alguns, que andavam com ele correndo gados nos territórios espanhóis tendo perdido 150 cavalos, e toda a boiada, que já tinham apanhado. Não deu autor.
Comunicaram-me pessoas fidedignas, que nas imediações de Bagé, há perto de 1000 homens empregados nesta ladroeira, e o pior é que se dizem apoiados por pessoas que o não deviam consentir, e em proveito de muitos que, por brio, e em consequência do seu caráter e patente, deviam ter em vista outros interesses nas circunstâncias atuais.

Março 15 [1817]
Chegaram 5 espanhóis remetidos, e aprisionados pelo Capitão Bento Manuel, que saiu do campo a 6 do corrente na Estância espanhola do Maxuca, situada entre as pontas de Ararunguá e Goiavos.

Março 16 [1817]
Os prisioneiros foram sucessivamente inquiridos na presença do tenente coronel [Joaquim Mariano] Galvão [de Moura] da Legião de São Paulo, e Policarpo Rolon depôs o que segue:
É natural de Montevidéu, soldado miliciano da companhia do capitão José Vieira, e pertence à Divisão de Artigas acampada na Purificacion.
Esta Divisão consta presentemente de 350 homens , comandados por La Torre, 700 por Verdun, 360 por Mondragon, 80 por Ayedo; e outros tantos por Gadea; 180 por Justo Meres; 300 Guaicurus, 300 Menuanes, e 180 charruas comandados por Aguiar. Paredes, que comanda os vecindários, de que ignora o número, acampa em Sandú. André Artigas (Andresito) acha-se do outro lado do Uruguai com 500 homens = Arenhúm, Governador de Santa Fé estava em marcha, para se reunir a José Artigas com 400 homens. Para o mesmo fim já estavam em marcha 200 Cordoveses, que recusaram prestar obediência a Buenos Aires, assim como 500 Guaicurus, que concorriam da baixada de Santa Fé.
Tinham passado ao outro lado do Uruguai 400 Correntinos, destinados (segundo diziam no Exército) a pacificar uma sublevação em Corrientes.
Otorgués tem na costa do Rio Negro 200 a 300 homens. Frutuoso Rivera 900 em Santa Luzia grande; e Miguel Barreiro 1500 em São José. Assim as forças de Artigas reunidas montam a 7000 homens.
A tropa está bem armada: a cavalaria de clavina, espada e pistola; e a infantaria de espingarda com baioneta; armamento novo, e há bastantes munições.
Artigas fez fortificar a Purificacion com 2 redutos que já concluiu, e outro, que esta a ponto de acabar, [...] e obra de 2 Franceses: estes redutos devem ser guarnecidos por 2 peças de artilharia, que já tem, de 12, 8 e 4, vindas do Arroio da China, e de Santa Fé alem de duas de 24, que espera de Cordoba.
Dizia-se no Exército de Artigas, que ele pretendia fazer-se forte na Purificacion, visto estar próximo o Inverno, e não querer violentar a cavalhada, que pretendia deixar descansar até ao Verão quando intentava novamente atacar os portugueses.
Este caudilho tem para cima de 2000 cavalos de reserva sobre o Uruguai e Daiman, e 1000 sobre o Uruguai e Hapeuy (?): e em cada um destes rincões há uma guarda de 10 homens.
Saiem também diariamente pequenas partidas de observação compostas de um sargento e 4 soldados além de outras de igual força que à noite vão tomar os passos. A maior parte da Cavalhada está gorda.
Artigas tem no porto da Purificacion 5 barcos pequenos, 4 barcas canhoneiras competentemente guarnecidas, 6 botes, e 5 canoas.
Frutuoso Rivera está indiferente com [Miguel] Barreiro por que este entregara Montevidéu sem resistência, deixando aos portugueses a artilharia carregada, munições, e para cima de 6000 fardamentos: mas consta que Artigas oficiara a ambos, para se congraçarem.
Artigas, depois da ação de Catalán, mandou o capitão Pedro Aquino com 10 homens com ordem de chegar ao lugar onde se deu a ação; e de observar os movimentos do Exercito Português: o qual desempenhou a comissão e recolheu-se dando parte de não ter encontrado o Exército. A esta partida que o Tenente Rubio Marques rendeu com 10 homens escolhidos como vaquianos da Fronteira, com ordem de se conservarem nas vizinhanças de Santa Ana 10 dias, e findos estes sai regularmente outra partida de igual número; e assim se continua. Não tem mandado partidas de maior circunstâncias.
Os outros quatro prisioneiros conformaram-se com o depoimento acima com pouca diferença: porém um deles deixou entrever que os 400 correntinos tinham marchado em socorro de Andreé Artigas, que se retirara depois que Chagas passou o Uruguai.
Apresentou-se Bento Manuel depois do sol posto com um prisioneiro. Não continuou a comissão de que fora encarregado por inconvenientes, que preciso averiguar.

Março 17 [1817]
Bento Manuel a quem eu dera cartas de recomendação para meu cunhado, o Major Marques, e para o Tenente Coronel José Maria de Almeida, veio entregar-me as cartas, e disse-me as notícias seguintes:
Tendo recebido ordem para seguir até Montevidéu com 8 homens de milícias e um vaquiano os quais deviam separar-se (como fica dito no extrato anterior) obtivera também licença para levar alguns índios a fim de correr gados na volta: que tendo chegado sem novidade às vizinhanças da Estância da Maxuca observara no dia 11 que ali havia inimigos; e em consequência mandara formar a indiada na frente para persuadi-los que eram dos seus. O que conseguiu até uma descida para a estância onde já não puderam deixar de ser conhecidos pelos uniformes, mas como se achavam vizinhos à casa da Estância, e os seus iam bem montados, pode apanhar os 5 que remeteu. Maxuca com os outros quatro puderam escapar-se. Estes 10 homens tinham saido de Purificacion, sem armas e com o destino de conduzir daquela estância para a vila, sebo e coiros em uma carreta que os nossos abandonaram (valha a verdade!). No mesmo dia de tarde observou 3 homens de desconfiança, e mandou despir as fardas de 3 dos seus; fez persegui-los e conseguiu apanhar um deles, que levava uma parada para Artigas. Eu li o ofício do comandante da partida Antonio Sarco, e continha que naquelas vizinhanças andavam muitos portugueses a correr gados, e por isso recorria a S. Senhoria para que lhe mandasse uma partida capaz de os apreender, e de coibir as corridas, e roubos, assim como algum tabaco de que muito precisavam. O prisioneiro declarou a Bento Manuel que os 10 homens andavam bem montados e armados. O capitão obrigou-o a levá-lo ao ponto onde disse que deixara Sarco com os 6 homens com que ficara, mas Bento Manuel já não achou senão vestígios de que ali estiveram.
Este espanhol é muito vivo, talvez enganasse a Bento Manuel sobre a situação da Partida. [...] Recusou declarar coisa alguma sobre a diligência de que fora encarregado. Bento Manuel receando ser descoberto recolheu-se ao acampamento. Disse-me também este capitão que sabia que sobre o Taquarembó patrulhava uma partida de 80 homens comandada por Filipe Gueria.

Março 18 [1817]
O senhor tenente general Curado mandou participar na revista do sol posto que sentia não ajudar aos seus camaradas nos exercícios diários, por moléstias.

Março 19 [1817]
Saíram em diligência Bento Manuel com 6 soldados milicianos, um [oficial] inferior e 8 dragões para fazer conduzir 30 homens que tinham sido avisados pelo Tenente Coronel [Manuel] Carneiro [de Silva Fontoura] para comparecer no Exército e o não fizeram. Dizem que conduzira ao mesmo tempo algumas mil rezes que correra. Semelhantes bombeiros não são proveitozos a um Exercito.
O senhor tenente general Curado teve notícias de terem aparecido espias inimigas sobre os Serros de Santana, e que os nossos tinham visto cavalos suados, abandonados no mato, próximo ao acampamento. Atribui-se esta circunstância não a bombeiros, mas sim a corrida de gados, que constituem, segundo dizem, uma das grandes especulações do exército.

Março 20 [1817]
Persuadi ao senhor Curado que me deixasse nomear o Alferes [Manuel de] Toledo [Pisa] da Cavalaria da Legião, para ir bombear as vizinhanças de Santana, e Serros de Carumbé, com 20 homens do mesmo corpo, e com destino de apreender as pequenas partidas que noticiaram os prisioneiros, o que consegui.
Recebi uma carta de Pedro Fagundes, comandante de Bagé, em data de 17 do corrente, e que remata da maneira seguinte = Os Gaúchos por esta fronteira se tem aproveitado da ambição com que os portugueses se cansam atrás de vacas, e proximamente mataram 7 ou 8 : não há temor, nem palavras, nem respeito, que os contenham de humilhantes tentativas =
O coronel Bento Correia da Câmara recebeu um oficio de Brito, ajudante de ordens de S. Ex.ª o senhor Marquês General, dirigido a Bagé, onde lhe participa que para ali marcham 40 praças do Regimento de Porto Alegre, e brevemente lhes serão remetidas as que faltam para completar 3 esquadrões. Teve ao mesmo tempo uma carta do capitão Joaquim de Azevedo e Sousa que lhe dá parte de ter chegado a Bagé com os mencionados 40 homens, e que ali esperava as suas ordens. O coronel, que se acha em Quaraí, onde o deixou o senhor Marquês e não tem recebido ordens algumas, que lhe pudesse comunicar, mandou apresentar ao senhor Curado o ofício e a participação.
O senhor Curado respondeu-lhe, que o senhor coronel podia seguir para Bagé se quisesse mas que estivesse persuadido que não levava consigo uma só praça das que existem no Exército. Câmara cala-se e oficia pelo mesmo canal – [...] la fin.
O tenente coronel Pinto disse-me que o senhor Curado, expondo-lhe o caso, acrescentara que era verdade, que Bento Manuel o avisara da parte de S. Ex.ª o Senhor Marquês, que o coronel Bento Correia da Câmara ia para Bagé com o Regimento de Porto Alegre, e que o indemnizaria com 1000 os quais mandaria para o Exército dentro de um mês; que isto mesmo não era parte oficial: mas ainda que a fosse a não cumpria porque como S. Ex.ª o senhor Marquês lhe prometia mandar 1000 em reféns de 180 praças do Regimento de Porto Alegre, que destinava para Bagé, ele também se achava autorizado para não cumprir a dita, visto que S. Ex.ª não desempenhava a dita e que nisto imitava ao Senhor Lecor.
O ajudante de ordens de S. Ex.ª o senhor Curado, General em chefe, Bulhões, disse-me que Fagundes tinha oficiado dizendo que já ali tinha tropas suficientes, tanto que intentava atacar os insurgentes que acampavam sobre o Rio Negro (suponho que os 80 de Gueria); e que recebera ordens de S. Ex.ª para atacar até ao mesmo Otorgués dando o comando desta expedição ao capitão Cunha.

Março 21 [1817]
Saiu o Alferes Toledo pelas 11 horas da manhã com 20 praças, incluídas 3 [oficiais] Inferiores. Abreu participou ao brigadeiro que tinha recebido notícias de que Chagas se achava do lado Ocidental do Uruguai com 900 homens e mandara passar 2000 cavalos: que os paraguaios se achavam combinados com ele debaixo da condição de que os portugueses não vexem os seus territórios. Esta última notícia especialmente merece quarentena, ao menos que seja oficialmente confirmada.

Março 23 [1817]
O senhor Curado deu-se por pronto. Chegaram os bombeiros do Abreu que tinham saido a 15 do corrente. Lemes [?] com outros dois nada tiveram que notar até a barra do Quaraí no Uruguai. Outros 3 foram até o Potrero sobre o Arapeí não encontraram inimigos: trouxeram algumas armas, 1 lança, 19 cartuxeiras, e 58 bainhas de baionetas em bom estado. 
Ordem do Dia sobre as Guerrilhas – (que vai) – 

Março 25 [1817]
Ordem para marcha a 27 – ignora-se para onde. Só se sabe que o brigadeiro João de Deus [Mena Barreto] insiste em que se marche para o Belarmino. O meu voto seria, que não retrocedessemos um passo, e que quando nos fosse necessário, ocupássemos outro ponto mais avançado sobre o mesmo Quaraí, visto estar providenciada suficientemente a segurança da fronteira do Rio Grande: porém o senhor Curado não consulta. Algumas vezes tem-se saído muito bem: outras muito mal.
Chegou o capitão João Afonso, 81 ½ alqueires de farinha! E vem destinada para os doentes. Recebi carta do meu Major Mota em que me participa estarem a partir 70 praças de Infantaria da Legião das praças que ali se acham; e 60 de milícias de Porto Alegre. Estimarei que chegue este pequeno reforço! Não há ainda notícia de Toledo.
Tivemos notícias de Fagundes que as dá de terem os insurgentes avançado até o Erval &c.  
N.B. Não se especificaram estas notícias porque o Brigadeiro acha que estará ao nível delas o senhor marechal Porteli.

[Oliveira]

[Março] 26 [1817]
Chegou o Toledo, alferes que tinha ido em diligência, sem novidade. Mandou-se suspender a marcha por ora.

[Fim]

terça-feira, 20 de junho de 2017

“Diário de um oficial superior de Cavalaria de Setembro de 1815 a Maio de 1816”


Autor: Sargento mor João Nepomuceno de Lima
Unidade: Cavalaria, Divisão de Voluntários Reais
Área: Lisboa, Rio de Janeiro, Ilha de Santa Catarina
Datas Extremas: 2.9.1815 - 31.5.1816
Fonte: "9º diário". 68 pp. manuscritas, Arquivo Histórico Militar, AHM 2/1/14/63

Nota: Este texto não está completo.
[O diário inicia em setembro de 1815]

2.9.1815 (sábado) – Fizeram exercício os dois corpos de cavalaria na presença do general da divisão [tenente general Carlos Frederico Lecor];

8.9.1815 (6.ª feira) – Da meia noite do dia 7 à uma da manhã de 8, houve um duelo entre o capitão [António José] Gama [Lobo] do 3.º Batalhão, e o alferes João Inácio Xavier do 4.º Batalhão, de que resultou ficar o capitão morto e o alferes ferido;
10.9.1815 (domingo) – Passou em continência, e fez exercício, o 1.º e 2.º corpos de cavalaria em presença do ministro da guerra e depois a artilharia;
11.9.1815 (2.ª feira) – Passaram mostra os dois corpos de cavalaria e artilharia – E depois embarcaram na fragata Fénix, e Príncipe D. Pedro, e nos navios Princesa do Brasil e Oceano;
12.9.1815 (3.ª feira) – Chuviscou;
13.9.1815 (4.ª feira) – Embarquei com a minha família a bordo do navio Princesa do Brasil (dia enublado), às 3 horas da tarde;
14.9.1815 (5.ª feira) – Dia enublado. A bordo do navio;
15.9.1815 (6.ª feira) – A bordo; choveu muito toda a madrugada;
16.9.1815 (sábado) – A bordo. Mau tempo. Saiu o Oceano que estava para ir connosco, indo comboiado pela fragata Pérola;
17.9.1815 (domingo) – Excelente dia. Demos à vela às 3 horas e um quarto da tarde, tendo estado fundeados defronte do largo de Belém, com maré de vazante, e vento norte = e juntamente, as fragatas Fénix e Príncipe D. Pedro.

[travessia do Atlântico]

26.9.1815 (3.ª feira) – (vento freco) Levantaram-se os soldados da 5.ª companhia, querendo conspirar-se contra os oficiais, e chegaram a atacar a guarda; porém, acomodou-se com pancadas – podia haver terrível consequência por se irem envolvendo soldados de outras companhias – os capitães [José de Barros e] Abreu e Filipe [Neri de Oliveira], que pressentiram o levantamento, o atalharam com a espada na mão;

[travessia do Atlântico]

12.10.1815 (domingo) – Avistou-se o Cabo Frio ao romper do dia = e duas sumacas pela manhã com rumo para o Rio. De Cabo Frio à Barra são 18 léguas – A costa é monstruosa e cheia de ilhas pequenas e inabitadas – às 9 da noite falámos a uma escuna, Correio da Bahia, que também andava pairando, a qual trazia 8 dias de viagem;
13.10.1815 (2.ª feira) – Muita névoa até às 9 da manhã, e depois dia muito claro, falámos a uma sumaca, que vinha do Rio da Prata com 43 dias de viagem – que entrou, e juntamente um bergantim carregado de escravatura da costa de África = Na entrada da barra à direita, fica o Forte de Santa Cruz à esquerda o de [espaço em branco] = Também há alguma ilhas como a das Cobras, que fica um tiro de pedra da cidade de S. Sebastião, uma laje a que chamam a ilha dos Ratos – Há também a ilha das Enchadas, onde está o hospital do ingleses, que serve para o da Divisão. Deu fundo o navio às 15 horas. Ainda não tinham chegado as fragatas.
14.10.1815 (3.ª feira) – Fui à Praia Grande, pela manhã cedo, falar ao coronel João Carlos de Saldanha [de Oliveira e Daun] [...] quartéis, e mais [...] o 2.º corpo, o que efectuei, ficando aquartelado na Armação, onde já se achava a artilharia da divisão, que tinha vindo no Oceano, o que tinha chegado a 10 dias antes. Os soldados ficaram muito bem aquartelados, porém os oficiais ficaram pessimamente em quartéis na Praia Grande;
15.10.1815 (4.ª feira) – Houve uma revista passada pelo Ajudante General Sebastião Pinto [de Araújo Correia] – chuviscou todo o dia. A revista foi ao 2.º corpo de cavalaria [...];

17.10.1815 (6.ª feira) – Chuviscou. Fui à cidade. Estive com o visconde de Barbacena, e [tenente coronel João Vieira] Tovar [e Albuquerque].

19.10.1815 (domingo) – Fui à cidade visitar o marechal Beresford, o Sebastião Pinto, e [tenente coronel António Feliciano Teles de Castro] Aparício, e [...] José Egídio;

23.10.1815 (5.ª feira) – Fomos visitar em corporação Beresford, [António de Azeredo] Araújo e marquês de Aguiar;

25.10.1815 (sábado) – Revista aos dois corpos de cavalaria, passada pelo coronel Aparício;

28.10.1815 (3.ª feira) – Revista passada pelo Ajudante General nos quartéis da Armação, em fato de polícia. Trovejou à tarde;

[...]

4.12.1815 (2.ª feira) – Houve exercício aos dois corpos de cavalaria em fato de polícia, e espada, comandado pelo coronel Aparício = Trabalhou-se mal porque o dito coronel, charlatão de primeira ordem, principiou a partir com os oficiais, sem tom, nem som, a fim de mostrar a alguns espectadores, que nada entendem de manobra, que à excepção dele, ninguém mais sabia coisa alguma = Porém a sua impostura é conhecida – Assistiu ao exercício o Ajudante General Sebastião Pinto. À tarde, veio o marechal Beresford, e foi ver os dois corpos, que o dito coronel tinha mandado ir à tarde, para lhes fazer exercício em fato de polícia, e espada. Não gostou de que os corpos fossem naquele vestuário, e que não trabalhassem a pé, como a infantaria. isto é culpa do dito coronel;
5.12.1815 (3.ª feira) – Beresford passou revista às 5 da manhã aos dois corpos e fez exercício – À tarde pela 5 também se formaram os dois corpos, e a artilharia, e passaram em continência, o que fizeram bem, e mandou-os embora. – Adoeci com uma inflamação de pele – Foi o marechal para a cidade;
6.12.1815 (4.ª feira) – Fiquei de cama. Exercícios de manhã e tarde;
7.12.1815 (5.ª feira) – Fiquei em casa. Exercícios de manhã e tarde. Veio o Príncipe de Santa Cruz para a cidade;

9.12.1815 (sábado) – Os oficiais superiores foram baijar a mão ao Príncipe. Não fui por estar doente. Exercício à tarde;
10.12.1815 (domingo) – Foram os oficiais de cavalaria em corporação beijar a mão ao príncipe;
11.12.1815 (2.ª feira) – Exercício à tarde;
12.12.1815 (3.ª feira) – Exercício de manhã e tarde;
13.12.1815 (4.ª feira) – Exercício de manhã e tarde;
14.12.1815 (5.ª feira) – Exercício de manhã e tarde;
15.12.1815 (6.ª feira) – Exercício de manhã e tarde;
16.12.1815 (sábado) – Exercício de manhã e tarde. Fui beijar a mão a Sua Alteza Real;
17.12.1815 (domingo) – Aniversário da rainha. Fui à cidade com a família. Vim da cidade às 23 horas.
18.12.1815 (2.ª feira) – Exercício de manhã e tarde;
19.12.1815 (3.ª feira) – Exercício às 4 horas da manhã no Campo de S. Bento, onde se achou Beresford. À tarde, exercício de espada no Campo de D. Helena;
20.12.1815 (4.ª feira) – às 5 horas da manhã no Campo de S. Bento, onde esperávamos Sua Alteza Real, porém ele foi em direitura aos quartéis da Armação, onde somente achou alguns doentes, e mulheres pertencentes aos corpos. À tarde, Sua Alteza Real passou revista aos corpos de cavalaria e artilharia, e depois de se passar em continência, o 2.º corpo fez o manejo de espada, com o ataque e a defesa – à noite, deu beija mão, em que mostrou a maior satisfação a toda a oficialidade, e aos corpos;
21.12.1815 (5.ª feira) – Manobra para sua Alteza, às 6 da manhã, no Campo de São Bento, do que ficou muito satisfeito. À tarde, deu o marechal ajudante general um jantar diplomático. À noite, beija mão;
22.12.1815 (6.ª feira) – Exercício no Campo de S. Bento a um esquadrão de 30 filas do 1.º corpo de cavalaria que montou em cavalos dos milicanos; o 2.º corpo esteve vendo formado em coluna cerrada, depois trabalhou a  artilharia em atirar ao alvo, onde fez excelente pontaria [...] granadas de lanternetas (?), tudo isto diante de sua Alteza. à tarde, exercício de espadão o 1.º corpo no Campo de D. Helena. Os corpos passaram primeiro em continência.
23.12.1815 (sábado) – Sua Alteza Real foi ver os quartéis da Armação.
24.12.1815 (domingo) – Foi Sua Alteza para a cidade pela manhã. O marechal general Beresford foi com o ministro da guerra Araújo ver os quartéis dos soldados;
25.12.1815 (2.ª feira, Natal) – Pedi licença até 31 do corrente = Temporal de vento e chuva das onze horas da noite para diante;
26.12.1815 (3.ª feira) – O mesmo tempo toda a madrugada. Fez bom dia. Fui ao beija mão à cidade;

29.12.1815 (6.ª feira) – Fui à cidade;
30.12.1815 (sábado) – Fui à cidade com a minha família, e lá ficámos;
31.12.1815 (domingo) – Fui beijar a mão ao Príncipe com minha família;

[1816]

1.1.1816 (2.ª feira) – Voltei para a Praia Grande pela manhã;
2.1.1816 (3.ª feira) – Embarcou trem da artilharia da divisão;
3.1.1816 (4.ª feira) – Continuou a embarcar trem da artilharia. = Fui à cidade;
4.1.1816 (5.ª feira) – Fui à cidade. Houve uma revista passada pelo coronel Aparício aos soldados em fato de polícia na Armação;

7.1.1816 (domingo) – Houve uma revista aos soldados em ordem de marcha nos quartéis da Armação passada pelo coronel Aparício;
8.1.1816 (2.ª feira) – Houve uma revista em fato de polícia, no dito sítio, passada pelo dito coronel. À tarde embarcou a tropa a bordo das fragatas Fénix, Príncipe D. Pedro, brigue Lebre, e fragatinha voador, e dois bergantis da praça Atrevido e Previdente [...];
9.1.1816 (3.ª feira) – Embarquei com a minha família a bordo da fragata Príncipe D. Pedro, onde embarcou a artilharia, e a 5.ª companhias do 2.º corpo e parte da 4.ª;
10.1.1816 (4.ª feira) – Fui à cidade com a minha família, onde jantámos;
11.1.1816 (5.ª feira) – Fui à cidade;
12.1.1816 (6.ª feira) – Fui à cidade e levantou a fragata o primeiro ferro;
13.1.1816 (sábado) – Levantámos os segundo ferro, de madrugada, e fomos dar fundo à Boa Viagem próximo à Torre de Santa Cruz, por falta de vento;
14.1.1816 (domingo) – Fizemos à vela às 5 da manhã, excelente dia, vento em pompa. Diminuímos pano por causa dos brigues Atrevido e Previdente;

17.1.1816 (4.ª feira) – Claro, o mesmo vento, bonança. – Avistámos o Morro pela manhã, e pela tarde passámos por entre a ilha do Arvoredo e terra firme. Demos fundo já noite na Enseada dos Ganchos, uma légua distante da ilha do Arvoredo;
18.1.1816 (5.ª feira) – Excelente dia = Suspendemos ferro e fizemos à vela pelas 7 horas da manhã, e fomos dar fundo entre as fortalezas da Ponta Grossa que está na ilha, e a de Santa Cruz, que está na terra firme a 4 léguas e meio distantes da Vila;
19.1.1816 (6.ª feira) – Desembarcámos pelas 8 até 9 horas da manhã de bordo da fragata, e desembarquei com a minha família no trapiche em Santa Catarina às uma e meia da tarde. Neste dia, desembarcou a tropa das outras embarcações, tendo principiado a desembarcar na véspera;
20.1.1816 (sábado) – Desembarcou o resto da tropa. À tarde, fez mau tempo com chuva e vento e trovoada;
21.1.1816 (domingo) – Continua o tempo. Chuviscou. O governador da Ilha deu um jantar aos oficiais superiores;

[...]

1.2.1816 (5.ª feira) – Passaram mostra os corpos de cavalaria e artilharia;

4.2.1816 (domingo) – Fui passar o dia a uma chácara com a minha família.

8.2.1816 (5.ª feira) – Houve exercício aos dois corpos de cavalaria [...];
9.2.1816 (6.ª feira) – Revista à vista do brigadeiro [Bernardo da] Silveira [Pinto];

11.2.1816 (domingo) – Fui passar o dia a uma chácara com a minha família = choveu, e trovejou à tarde, e princípio de noite;
 14.2.1816 (4.ª feira) – Excelente dia = Houve uma revista e exercício aos corpos de cavalaria pelo coronel;

[...]

23.2.1816 (6.ª feira) – Excelente manhã, e à tarde fizeram trovoadas terríveis com muita chuva;
24.2.1816 (sábado) – Excelente dia = Fui com a minha família, e outra pessoas de amizade embarcados passar o Entrudo a uma chácara.
25.2.1816 (domingo) – Domingo de Entrudo;

28.2.1816 (4.ª feira) – Voltámos para a Vila por terra;

1.3.1816 (6.ª feira) – Passou mostra de Tesouraria o 1.º corpo de cavalaria;
2.3.1816 (sábado) – Passou mostra o 2.º corpo, e artilharia;
3.3.1816 (domingo) – Chegou o resto da cavalaria, que tinha ficado em Lisboa.
4 e 5.3.1816 (2.ª e 3.ª feira) – Muito calor;

8.3.1816 (6.ª feira) – Calor = Trovejou e chuviscou de tarde e à noite;
9.3.1816 (sábado) – Calor = Vieram a enterrar dois marujos mortos por um raio, que caiu em um bergantim ontem, deixando outro homem quase morto;
10.3.1816 (domingo) – Fui às águas férreas com a minha família. Tro[v]ejou, e choveu à tarde e à noite;

14.3.1816 (5.ª feira) – Exercício às 6 da manhã;

30.3.1816 (sábado) – Comprei um cavalo por 11[$000]
1.4.1816 (2.ª feira) – Mostra de Tesouraria à cavalaria, e artilharia = dia enublado, vento e chuvisco;

3.4.1816 (4.ª feira) – Chegou um brigue com a notícia da morte da rainha;
5.4.1816 (6.ª feira) – Formou a cavalaria com armas em funeral;
6.4.1816 (sábado) – Fui para a chácara com a minha família = choveu e ventou à noite;

[...]

11.4.1816 (5.ª feira) – Endoenças. Excelente dia;
12.4.1816 (6.ª feira) – Paixão;
13.4.1816 (sábado) – Aleluia. Fui ao continente e comprei um cavalo por 6200 [?], vim com a família da chácara;
14.4.1816 (domingo) – Páscoa;

[...]

22.4.1816 (2.ª feira) – Fui para a Chácara com a minha família, e fui conduzir um major preso a Santa Cruz = 4 léguas e meia da vila. É uma fortaleza construída em um ilhote, que fica distante do continente um oitavo de légua = Fui dormir à Cacixa (?), um lugar de pescadores = Às 4 horas da manhã embarquei, e arribámos à ilha por causa de um aguaceiro, em um sítio chamado Sambaquí, e fomos eu, o capitão Filipe Neri [de Oliveira], e um negociante, Monteiro, que me acompanharam até a freguesia de Santo António a pé. Santo António está à borda do mar, e é muito ameno. Não posso dizer quantos vizinhos tem. Embarcámos às 10 horas e chegámos à Praia de Fora, que são três léguas à 1 hora da tarde = Muito vento e chuvisco toda a tarde. Fui para a chácara onde estava a minha família;

2.5.1816 (5.ª feira) – Mostra de Tesouraria;

[...]

5.5.11816 (domingo) – Fui para a vila com a família = Comprei um cavalo por 4[$000];
6.5.1816 (2.ª feira) – Exercício de manhã; e à tarde espadão comandados por Tovar;
7.5.1816 (3.ª feira) – Exercício de manhã e tarde, comandados por [António Manuel de Almeida Morais] Pessanha;

9.5.1816 (5.ª feira) – Excelente dia. = Tive uma dor de cólica furiosa. Exercício comandado por Duarte [Joaquim Correia de Mesquita];

13.5.1816 (2.ª feira) – Anos de Sua Alteza Real o Príncipe Regente. = A cavalaria e a artilharia dos Voluntários Reais do Príncipe formaram-se na praça, e deram descargas e fogo de alegria;

16.5.1816 (5.ª feira) – Dia enublado, e chuva; Exercício comandado por [António de] Castro [Ribeiro];
17.5.1816 (6.ª feira) – Exercício, e espadão, comandados por mim. Dia enublado;

20.5.1816  (2.ª feira) – Exercício comandado pelo coronel. = Choveu todo o dia;
21.5.1816 (3.ª feira) – Excelente dia. Exercício comandado pelo capitão [José António] Esteves [de Mendonça e Sá];

23.5.1816 (5.ª feira) – Ascensão.

[Diário acaba no dia 31.5.1816]